São Paulo, 07 de dezembro de 2015
Senhora Presidente,
“Verba volant, scripta manent”.
Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso
noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas
no Palácio.
Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já
deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso alardear
publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes
cinco anos.
Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da
Constituição Federal. Sei quais são as funções do Vice. À minha natural
discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.
Entretanto, sempre tive ciência da absoluta
desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB.
Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e
partidário ao seu governo.
Basta ressaltar que na última convenção apenas
59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu o
candidato à reeleição à Vice.
Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu
governo usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do
respeito que granjeei no partido.
Isso tudo não gerou confiança em mim. Gera
desconfiança e menosprezo do governo.
Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.
1.
Passei os quatro primeiros anos de
governo como vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo
político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só
era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.
2.
Jamais eu ou o PMDB fomos chamados
para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros
acessórios, secundários, subsidiários.
3.
A senhora, no segundo mandato, à
última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco
fez belíssimo trabalho, elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma
indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato
no dia seguinte, ao telefone.
4.
No episódio Eliseu Padilha, mais
recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas “desfeitas”, culminando com
o que o governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso prévio, nome
com perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a ANAC.Alardeou-se
a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta
“conspiração”.
5.
Quando a senhora fez um apelo para
que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava
muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste
fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos
empresários. Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o
ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequencia no governo. Os acordos
assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de
lideres e bancadas ao longo do tempo, solicitando apoio com a nossa
credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.
6.
De qualquer forma, sou presidente do
PMDB, e a senhora resolveu ignorar-me, chamando o líder Picciani e seu pai para
fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do
Partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a
senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o Deputado Edinho
Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.
7.
Democrata que sou, converso, sim,
senhora Presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no
Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada
graças aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi
aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do
nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que
deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar.
8.
Recordo, ainda, que a senhora, na
posse, manteve reunião de duas horas com o Vice-Presidente Joe Biden — com quem
construí boa amizade — sem convidar-me o que gerou em seus assessores a
pergunta: “O que é que houve que numa reunião com o Vice-Presidente dos Estados
Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da “espionagem”
americana, quando as conversas começaram a ser retomadas, a senhora mandava o
Ministro da Justiça para conversar com o Vice-Presidente dos Estados Unidos.
Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança;
9.
Mais recentemente, conversa nossa
(das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica,
sem nenhuma conexão com o teor da conversa.
10.
Até o programa “Uma Ponte para o
Futuro”, aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para
recuperar a economia e resgatar a confiança, foi tido como manobra desleal.
11.
PMDB tem ciência de que o governo
busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso.
A senhora sabe que, como Presidente do PMDB, devo
manter cauteloso silencio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a
unidade partidária.
Passados estes momentos críticos, tenho certeza de
que o País terá tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais.
Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em
mim e no PMDB hoje e não terá amanhã.
Lamento, mas esta é a minha convicção.
Respeitosamente, \ L TEMER
A Sua Excelência a Senhora
Doutora DILMA ROUSSEFF
DO. Presidente da República do Brasil
Palácio do Planalto
Brasília, D.F.
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Brasília, 10 de dezembro de 2015.
João Lúcio Filho